terça-feira, 6 de junho de 2023

tijolos.


palavras são como tijolos de uma casa,
sei que há aquelas feitas de concreto puro, modernas. 
há as de madeira, um pouco mais vintage. 
mas as minhas palavras são tijolos. 

assim, de barro, moldáveis, hora quentes, hora duras, às vezes quebráveis, mas sempre tijolos. 
sólidas e duras, as unidades abandonadas delas servem para muita coisa: constroem muros, usam para brincar e, inclusive, para agredir. 

os cacos das minhas palavras-tijolos desenham outras histórias, outras palavras. 
minhas palavras-tijolos juntas construíram o que eu sou, me tornaram a casa-eu. 
me sustentam e eu a elas. 


sopram, sopram. 
mas sou sólida. 

segunda-feira, 28 de novembro de 2022

quando lembro de escrever

 lembro de mim quando não era eu.

quando escrever era minha válvula de escape,

minha fortaleza e minha única realidade possível,

quando sonhava em viver de palavras da minha cabeça, não de palavras de quem me lê. 

lembro de mim quando escrever era tudo que me restava para sentir. 

quando o sentir era tudo que eu tinha para escrever. 

lembro de mim quando escrevia.

lembro de mim quando sentia. 

lembro.

ainda que não sinta. 

ainda que não escreva.

ainda que não lembre



terça-feira, 2 de março de 2021

pássaros.


Como Prometeu, todos os dias tem um pássaro que se alimenta de algo meu que se regenera. 

E quando o sol sai, eu tento matá-lo

com o peso das palavras que engulo.

No peito-gaiola, eu ouço o pássaro cantar, implorando por liberdade. 

O pássaro continua a se alimentar das migalhas que o meu peito ficou. 

Mas, se abro o peito e liberto. Seria só isso e nada mais?




terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Vitória-régia.

Mote do texto: hoje, oito, dia de Oxum. 

 


das mulheres e das flores que vivem sobre a água, eu aprendi uma só lição: admire, mas não pise.

O diabo podia ter lhe dado os olhos, o corpo, os cabelos e o que mais que fosse. Mas, ele não havia lhe dado a alma, muito menos o coração. 
O coração era de Oxum. Ela querendo, ou não, era dotada da maior capacidade de amar que eu havia visto. 
Amor ingênuo, quase cego. Os olhos? Malditos sejam. Podiam me seduzir com tal força que eu duvido muito que não pudessem me matar. 
A boca doce, de mel, que cada palavra é um feitiço. Falava manso, só que com firmeza invejável. Sabia o que fazer das palavras. Particularidade além, era só mesmo sua obediência à Oxum. Filha da feiticeira, da Rainha. Tão particular e tão uma da outra, que a devoção a fez quem era.
Podia ser Rita, mas também era Capitu, que foi Bárbara, mas que de vez em quando era Valerie, que ao mesmo era Beatriz, todavia, ela era todas juntas e nenhuma delas. 

Era o diabo em mulher, aquela filha da Lua, aquela d'Oxum. 

Ora ye ye ô, Oxum!


quarta-feira, 21 de outubro de 2020

meias

somos eu e as paredes 












somos eu e as meias-paredes com suas cores vivas que significavam alguma coisa quando a gente escolheu a tonalidade. quando a gente disse que o cimento queimado ia combinar com amarelo, porque era meio-eu, meio-você.

somos eu e a metade da cama que nunca sobrava quando você tava aqui. que agora eu coloco meus livros, computador e um punhado de folhas amassadas que escrevi meio poema pra você.

somos eu e as tuas meias, eu e as minhas meias. Eu e aquelas meias lá do bob espoja e do patrick que são as nossas-minhas-suas-meias.

somos eu e a metade do que sobrou.